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Após longo período de pesquisas realizadas na Universidade de Leiden, na Holanda, a pesquisadora brasileira Carla Rosenberg, do Instituto de Biociências (IB) da Universidade de São Paulo (USP), ajudou a desenvolver um teste mais eficiente para identificar a causa de deficiência intelectual e anomalias congênitas, que continua sendo utilizado em suas pesquisas no Brasil. Para estimular colaborações de pesquisa igualmente promissoras, a FAPESP assinou ontem (14/03) um acordo de cooperação com a universidade holandesa, durante workshop em São Paulo (SP).
O objetivo do evento, que contou com apresentações de pesquisas realizadas em instituições de São Paulo e na Universidade de Leiden, foi identificar interesses comuns e discutir possibilidades de parceria.

“São diversas as oportunidades surgidas a partir deste encontro e da formalização de um acordo entre as instituições, desde a organização de reuniões científicas para encorajar e viabilizar interações entre pesquisadores até a realização de pesquisa propriamente, na forma de esforços científicos conjuntos em torno de temas de interesse mútuo, dentro de todo o conjunto de potenciais identificados e a exemplo das diversas colaborações já realizadas”, disse José Goldemberg, presidente da FAPESP.

Rosenberg, que foi professora associada na Universidade de Leiden entre 1999 e 2003 e hoje é uma das pesquisadoras principais do Centro de Estudos do Genoma Humano e de Células-Tronco (CEGH-CEL), destacou o legado do trabalho na universidade holandesa para o desenvolvimento de sua pesquisa, que culminou na implementação de um array para o diagnóstico mais preciso de deficiências intelectuais por laboratórios brasileiros.

“Sempre foi um grande problema o diagnóstico de deficiência intelectual de causas desconhecidas, que não são tão facilmente identificadas quanto é a síndrome de Down, por exemplo, porque os motivos são variados e os casos, muito heterogêneos. Há uma grande quantidade de pessoas que ficam sem diagnóstico por toda a vida, o que é prejudicial não só para o prognóstico do paciente, mas também para o processo de aconselhamento genético, que inclui a identificação de portadores, o cálculo do risco de recorrência e o diagnóstico pré-natal”, explicou a pesquisadora.

Desde que foi trazido para o Brasil, o array desenvolvido em Leiden, composto originalmente por 3.500 sondas, foi sendo aprimorado e atualmente é produzido comercialmente, podendo chegar a milhões de sondas. Dispostas em uma lâmina de vidro, elas recebem o DNA do paciente e identificam se há perda ou ganho de material genético, o que, seguindo-se os protocolos estabelecidos, determina o diagnóstico mais preciso.

“Nas pesquisas mais recentes, foram investigadas, inicialmente, essas alterações submicroscópicas em cerca de 400 famílias com indivíduos afetados por deficiência mental ou anomalias congênitas. A pesquisa detectou alterações cromossômicas críticas em 30% dos pacientes”, disse a respeito do projeto temático Desequilíbrios genômicos submicroscópicos em quadros clínicos específicos de anomalias congênitas e deficiência mental, realizado com o apoio da FAPESP.

Os arrays utilizados foram inicialmente produzidos por Rosenberg na Universidade de Leiden e doados à USP. A pesquisa teve prosseguimento considerando grupos com fenótipos específicos, envolvendo 400 pacientes e 200 controles, utilizando uma plataforma comercial de alta resolução do teste e considerando os quadros clínicos escolhidos para o estudo, com etiologia parcial ou totalmente desconhecida, como anomalias Müllerianas, surdez, síndrome de Silver-Russel, deficiência intelectual de herança ligado ao cromossomo X e câncer pediátrico associado a defeitos congênitos. Aproximadamente 2.500 famílias já foram investigadas.

A expectativa da pesquisadora é que o teste, que já tem cobertura por várias seguradoras de saúde, seja incorporado ao Sistema Único de Saúde (SUS) para facilitar o diagnóstico dessas e de outras deficiências.

A pesquisa foi realizada no âmbito do CEGH-CEL – um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPIDs) apoiados pela FAPESP –, coordenado pela geneticista Mayana Zatz, que assistiu ao workshop e se disse animada com as possibilidades de colaboração com a Universidade de Leiden em outras frentes de pesquisa, em especial relacionadas aos estudos do envelhecimento humano.

“O envelhecimento possui várias facetas e a junção de expertises entre São Paulo e Leiden pode ajudar a entender como podemos envelhecer com mais saúde, particularmente em São Paulo, um ambiente com uma série de dificuldades nesse sentido em consequência do estilo de vida e das condições ambientais, entre outros fatores. Já coletamos DNA de mais de 1.400 pessoas com mais de 60 anos e as diferenças étnicas entre as populações brasileira e holandesa podem levar a grandes contribuições entre os grupos”, disse à Agência FAPESP.

Eline Slagboom, chefe da Seção de Epidemiologia Molecular do Leiden University Medical Center (LUMC), falou na ocasião sobre envelhecimento saudável a partir de uma perspectiva biomédica e clínica e das possibilidades de cooperação com a USP e outras instituições de São Paulo em pesquisas na área.

“Existem evidências muito claras da influência da hereditariedade na longevidade humana, e há muito interesse da comunidade científica na identificação de genes associados a pessoas que vivem mais. Nós participamos da maior varredura genômica já realizada para identificar esses ‘alelos da longevidade’ e acreditamos que temos muito com o que colaborar – e aprender – com os pesquisadores brasileiros que atuam nessa área e que têm conseguido resultados muito importantes”, destacou.

O acordo

Os participantes do workshop na FAPESP destacaram ainda oportunidades de colaborações em outras áreas das Ciências da Vida, como o estudo das estruturas das moléculas por meio de crio-microscopia eletrônica (crio-ME), na qual a amostra biológica é estudada a temperaturas criogênicas e preservada em gelo; Ciências Sociais, com apresentações sobre avaliação de estratégias de fomento à pesquisa e legislações específicas do Brasil e da Holanda; e Física, com atualizações sobre as pesquisas com grafeno em São Paulo e na Universidade de Leiden e os dispositivos quânticos como plataformas para informação, entre outros temas.

Apesar dos destaques da programação, todos os campos do conhecimento poderão ser abrangidos pelo acordo, sendo que áreas de interesse comum poderão ser determinadas pelo comitê gestor em chamadas de propostas de pesquisa.

“As possibilidades são inúmeras e nisso reside o potencial do acordo, evidenciado ao longo do workshop pelos interesses comuns entre os grupos de pesquisa e pelos potenciais identificados. A FAPESP entende que o desenvolvimento científico só é possível por meio do intercâmbio do conhecimento e por isso investe esforços em mais esse acordo de cooperação”, disse Marie-Anne Van Sluys, do IB-USP, membro da Coordenação Adjunta de Ciências da Vida.

Cada parte do acordo será responsável pelo financiamento de suas equipes de pesquisa envolvidas em projetos aprovados. O aporte de recursos para apoio a projetos selecionados será definido em cada chamada.

Agência FAPESP