Os vários eventos que ocorreram nos Estados Unidos e no resto do mundo tinham um histórico conhecido de bullying. Lídia Weber, pós-doutora em Psicologia pela UnB, explica que no caso de Columbine dá para perceber características de uma cultura armamentista. “Qualquer um pode comprar arma no país”, diz. “A violência de um modo geral é incentivada. Em metade das escolas ainda é permitido usar punição física contra as crianças, completa”. Para a pesquisadora, a tragédia de Tasso da Silveira parece ainda mais grave por ocorrer no Brasil. “O grande choque é que aqui isso nunca aconteceu”.
Ainda é cedo para um diagnóstico da motivação e do quadro mental do assassino. Mas a professora Ângela Branco, coordenadora do Laboratório de Microgênese nas Interações Sociais da UnB, acredita que a combinação entre um desequilibro mental e um histórico de humilhação na escola pode ter sido o estopim. “Sem dúvida, o rapaz é uma pessoa descompensada mentalmente”, diz. “O exemplo de hoje é o pior efeito que o bullying pode causar. É o máximo que a gente pode encontrar”, afirma a professora.
“Por que ele escolheu a escola? Podia ter ido para a rua, para o shopping, para um ônibus. Ir para a escola tem um sentido”, afirma. “Com certeza existiu alguma coisa na escola que o incomodou. Se fosse um problema com uma pessoa específica, seria muito pouco provável que ele saísse matando todo mundo. Tinha um ódio generalizado”, sustenta.
Ângela acredita que o papel da escola, hoje em dia, está reduzido. “A escola se vê responsável quase que especificamente pelo desenvolvimento intelectual das crianças. Fica preocupada com os índices de aprovação, notas e vestibular”, explica. A professora afirma que o discurso de educar de fato, formando cidadãos, acaba perdendo para uma visão exclusiva do conteúdo. “Não é problema só da escola, é da sociedade como um todo, que empurra para a instituição o papel de educar moralmente”, completa.
“As crianças passam uma grande parte da vida na escola. E convivem num contexto que está muito mais orientado para a competição e não para a socialização”, argumenta a professora. Ela afirma que nem sempre os professores se comportam de maneira exemplar a acaba prevalecendo um clima de descaso em relação a fatores como respeito, moral, tolerância, compreensão, solidariedade e justiça.
RETORNO – As especialistas afirmam que deve haver um trabalho de reestruturação do ambiente escolar, para que as aulas sejam retomadas da melhor forma possível. “Evidentemente que essa escola não vai poder esconder o sol com a peneira”, diz Ângela. “Por um tempo vai ser muito traumático. Vai ter de haver um trabalho conjunto no sentido de levar as crianças a refletir, a conversar”, explica. A professora ressalta a importância dos alunos não guardarem a sensação de que foram amaldiçoados ou que o problema está na escola.
“Será necessário apoio psicológico, da família, dos amigos que ficaram, dos professores”, diz Lídia. Ela explica que, ao entrar na escola novamente, os alunos e professores se lembrarão, inevitavelmente, do episódio. “Isso se chama condicionamento respondente. É quando as sinapses, no cérebro, vão associar duas coisas: a escola como um lugar bacana e como um lugar de tragédia e morte”. Para que a imagem do crime seja retirada da mente de quem estava ali, é necessário associar de novo a escola com coisas boas.
Para isso, Lídia acredita que é importante que a comunidade de Tasso da Silveira viva um período de luto. Ela explica que é importante, também, que as atividades não demorem muito a voltar ao normal. “O processo de despedida é importantíssimo. Despedir-se e homenagear as pessoas é o primeiro processo”, diz. “Depois, é importante ir retomando, mesmo que seja gradual. Tem que conversar com as crianças, reaproximá-las de forma positiva do ambiente de ensino”, completa.
UnB Agência